Edicões Gambiarra Profana/Folha Cultural Pataxó

quinta-feira, 29 de março de 2012

BRISA LEVE


BRISA LEVE
(Ao meu amigo e irmão de coração Cláudio Rangel -Músico, compositor e poeta)

Numa manhã Y caminhava pela praia pensando na vida, olhando o mar, que estava calmo, sentindo a brisa tocar de leve seu rosto. Era uma praia quase deserta, tranqüila no interior e ao longe a paisagem era pintada por barcos que enfeitavam o mar e seus olhos.
Depois de caminhar por algum tempo Y encontrou W, seu melhor e inseparável amigo, se conheciam tanto que podiam sentir quando um estava triste ou alegre. Todos os dias se encontravam na praia, caminhavam juntos e sentavam num quiosque e ficavam horas conversando, não viam o tempo passar, não importava se tinham assunto, se não tivessem, inventavam, em outros dias, mas eram poucos, não se viam ou conversavam pouco, mas estavam sempre por ali, na praia que tanto amavam e onde se sentiam bem.
Nessa manhã enquanto conversavam no quiosque à beira mar Y sentiu que W estava triste e perguntou ao amigo:
- Por que está triste?
W responde:
-Já se passam dias ou mais de mês que você não visita minha casa
Y ficou olhando o vazio sem saber o que falar, o interessante é que W quase todos os dias visitava a casa de Y, mesmo que fosse por minutos, para tomar um café ou desejar um bom dia ou boa noite. Depois de um breve momento Y disse:
- Talvez seja porque nos encontramos todos os dias na praia
W baixou os olhos e ficou quieto por um momento, Y sentiu que W se entristecera, mas não disse nada, ficou em silêncio que era quebrado pelo barulho das ondas e o som das gaivotas. Na verdade Y não percebera naquela hora que, às vezes fazemos falta a quem nos ama. Levantaram-se, despediram-se e seguiram seus caminhos para as ocupações do dia.
À noite quando estava só Y ficou refletindo sobre o que seu amigo W disse e viu que é muito importante visitar um amigo em sua casa, pois ali é nosso coração, nosso interior, nossa casa é nosso mundo, é onde queremos compartilhar nossa vida com quem amamos, é ali que W se sente feliz em poder ver no retrato que fica na memória que viveu um pouco de si com amigos que ama. Então Y viu que não basta visitar a casa de um amigo uma só vez, porque cada momento é um pedaço da vida, que é feita de infinitos momentos e assim ele percebeu que é importante para W sentir sua presença nesses momentos.
No outro dia pela manhã, na beira da praia se encontraram como sempre, caminharam juntos pela areia sentindo todo encanto da paisagem, sentaram-se no mesmo quiosque e começaram a conversar e num momento Y disse:
- Hoje à noite irei jantar em sua casa, vamos ouvir música e conversar.
Y sentiu a felicidade nos olhos de W e falou:
- Sei que por estarmos sempre juntos às vezes esqueço de lhe visitar, mas não esqueço de você, sei que somos amigos e que sou importante pra você e por isso farei o impossível para sempre visitar sua casa.
W abriu um sorriso contagiante e Y sentiu no coração aquele momento de felicidade e por estar ali com aquele amigo que tanto ama. A noite chegou e Y ficou em casa lendo e ouvindo música, depois foi até a janela e ficou a olhar a noite estrelada, esquecendo a promessa que fez e nem mesmo lembrou do amigo que ficou esperando.
Os dias e os meses se passaram e nada mudou entre eles, mas numa noite Y lembrou-se daquela manhã que fez a promessa de jantar com W, lembrou que se esqueceu e que a manhã seguinte estava chuvosa, mar revolto e céu cinza e triste, mas nada mudou, nem mesmo a amizade, apenas um detalhe lhe chamou a atenção: Nunca mais seu amigo inseparável o convidou para visitar sua casa, que ainda estava lá, perto da praia, numa rua tranqüila e arborizada e que estava sempre com as portas abertas.

Amigo(a) se ainda não teve a oportunidade de ler minha entrevista no blog da Anne Liere, visite o link abaixo

quinta-feira, 22 de março de 2012

PESCADOR DE SONHOS


Tudo passou na hora que desbotou
Na hora que deixou de ser
Quando a maresia trouxe o outro lado da cor
O outro lado da dor

Tudo passou na hora que tinha que partir
Partir para o nevoeiro
Partir pra solidão do mar
Partir sem saber se iria voltar

Iria apenas partir
Não importava se iria ou não pescar
Importava sim
Poder se descobrir

Não importava se a dor que sentia era feita de flor
Ou se amargas lembranças iriam voltar
Só queria mesmo era partir para o mar

Só queria olhar para o horizonte e se entregar
Viver uma aventura para se esquecer de amar
Não importava se iria encontrar um marlim
Ou apenas sorrir para as estrelas ao invés de chorar
Ao invés de querer desistir de sonhar

Talvez fosse mesmo outro velho em busca do mar
Ou apenas um jovem velho que não soube amar
Que não soube pescar na beira da praia
Que nem mesmo saboreou uma raia

A lua secou
Secou sem lágrimas para desabrochar
Secou sem poder olhar os olhos que queria abraçar
Secou sem seus encantos poder mostrar
Sem ver o sol que queria amar

Tudo acabou
Acabou na hora que a flor sem orvalho suspirou
Na noite que seu mar secou
Nos olhos que ao olhar serenou
Na única noite que amou

Talvez fosse mesmo um velho jovem que estava partindo
Ou um velho que viveu sua breve vida sorrindo
Mas que se esqueceu de tentar naufragar
De se agarrar a tênue vida que a solidão nos dá
Que se esqueceu de lembrar que para viver
Era preciso brincar
De sonhar
De viver para amar

quinta-feira, 15 de março de 2012

ANJO CINZENTO



Talvez a noite não seja estrelada
Não tenha um céu cinzento
Mas tenha um licor na mesa do bar
Para que aqueça um pouco o relento

Os olhos já não sabem dos anjos
Não medem pontes
Não querem se esconder da chuva
Ainda sonham com a fada escondida na fonte

Talvez o bar seja apenas outro lar
Onde possa esconder a tristeza
Até a saudade passar

Talvez a vida esteja mesmo na mesa do bar
Nos olhos que já não querem sonhar
No coração que já não pode amar

Arnoldo Pimentel


Amigo(a) leitor(a) se tiver um tempinho leia a “Trilogia da Casinha Branca”, são três pequenos contos de minha autoria, todos inspirados numa casinha branca com portas e janelas verdes, os links abaixo, deixe seu comentário, é muito importante pra mim,assim como é importante sua visita e sua amizade.Obrigado.

ENQUANTO NOSFERATU PERCORRE A PAISAGEM DA SALA QUE FICOU ESQUECIDA NO VENTO

MURMÚRIOS DAS ÁGUAS



QUINTAL

quinta-feira, 8 de março de 2012

POR DO SOL

 
Tem uma canoa seguindo sem rumo
Pelo rio da vida
Um rio que se alarga
Até chegar ao nada

Uma canoa banhada pelo por do sol
Que abre caminho por cima da floresta
Por dentro do verde da vegetação
Tocando com sua claridade cada fresta

Uma canoa pintada com cores de desesperança
Que sacia sua sede de sonhar olhando o tempo
Procurando nas árvores o colibri
Sonhando com os dias de felicidade que não vivi

Tem uma canoa buscando a beleza do entardecer
Como a beleza solitária que ainda sonha ver
Que ainda pode vir
Que ainda a faz sorrir

Uma canoa que baila no rio sem vida
Sem peixes no aquário quebrado
Sem boto cor-de-rosa
Ou unicórnio alado

Tem uma canoa acariciada pelo por do sol
Que navega dentro da floresta ilusória do meu coração
Beijada pelo olhar do vento
Um vento chamado solidão

Arnoldo Pimentel

quinta-feira, 1 de março de 2012

CASA NO CAMPO


Um dia você terá uma casa no campo
Onde poderá ver a paisagem verde
As flores enfeitando seu dia
Brincando num simples balanço

Vai poder correr pela sua varanda
Jogar o chapéu de couro para o alto
Balançar seus cabelos e depois de caminhar a pé
Sentar-se à mesa no fim da tarde para saborear seu café

Um dia você terá uma casa no campo
Com as noites cobertas de estrelas brilhantes
Sentir a brisa fresca que beija as folhas
E pensar porque não escolheu viver assim antes

Um dia você vai sorrir
Em sua casa no campo
Colherá frutas frescas no pomar
Frutas doces como o brilho do seu olhar

Nas manhãs de primavera se encantará
Ouvindo o cantar daquele canário
E como o outro lindo pássaro
Voltará a voar, a sonhar

Um dia você vai brincar no balanço
Na sua casa de campo
E verá aquela vila tranqüila lá longe
E nunca mais se lembrará do seu pranto

Um dia você vai ser muito feliz
Feliz como um simples
E doce acalanto
Na sua casa no campo 


Arnoldo Pimentel